Espetáculo polêmico revoltou cristãos quando estrou na Broadway em 1971; Jorge Takla dirigirá a versão nacional
Quando estreou na Broadway em 1971, o musical Jesus Cristo Superstar
revoltou cristãos mais conservadores, que consideraram o espetáculo
blasfemo. Afinal, a história é narrada por Judas Iscariotes, que mantém
uma ambígua relação com Jesus ao não aceitá-lo como deus (para ele, a
condição humana é mais importante) e com Maria Madalena que, além de ter
mais destaque que a Virgem Maria, não esconde uma forte atração por
Jesus. “Esses tabus não envelheceram e talvez possamos enfrentá-los
novamente”, comenta Jorge Takla, diretor de uma nova versão de Jesus
Cristo Superstar que estreia em março em São Paulo.
Especialista na direção e produção de musicais, gênero que domina como
poucos no Brasil, Takla estendeu sua preocupação ao elenco de 29 atores,
que se reuniu pela primeira vez nesta semana em encontro presenciado
pelo Estado. “Já foi feita uma exaustiva pesquisa histórica pela
produção para evitar equívocos e mal-entendidos”, disse ele, preparando o
espírito do grupo.
A primeira montagem do musical no Brasil aconteceu em 1972, com Eduardo
Conde no papel principal. Produzida pela T4F (a mesma de megassucessos
como O Rei Leão, que está prestes a bater o recorde nacional, com 455
mil espectadores em nove meses de temporada), a nova estreia no dia 13
de março no teatro do Complexo Ohtake Cultural. Nesta semana, além de se
conhecerem melhor, os atores receberam as partituras para estudar (os
ensaios começam no dia 13 de janeiro) e tiraram as medidas para os
figurinos criados por Mira Haar.
Como se tornou hábito nas produções brasileiras, a seleção do elenco foi
disputada – especialmente para esta montagem. “Trata-se de um musical
com uma pegada muito forte no rock, o que influencia a coreografia”,
comenta Takla. “Mas a partitura também é complexa, exigindo
especialmente nos agudos.”
Criado por Tim Rice (letras) e Andrew Lloyd Webber (melodia), o musical
tornou-se clássico por utilizar o estilo como linguagem, estabelecendo
de vez o gênero rock musical (que vinha sendo rascunhado no teatro desde
os anos 60 e teve sua explosão em Hair, de 1968) e associando o
rock-n’-roll à rebeldia libertária que Jesus representa para seus
discípulos.
A montagem brasileira é a mesma do revival que aconteceu na Broadway no
ano passado. E, como sempre acontece nos espetáculos criados por Webber e
Rice, a dupla participa decisivamente na montagem do elenco: os dois
receberam vídeos com os testes de candidatos aos sete principais papéis e
seus votos tiveram um peso considerável.
Assim, Jesus será interpretado por Igor Rickli, que participou de Hair,
na brilhante versão de Charles Möeller e Claudio Botelho, e também em
Judy Garland – O Fim do Arco-Íris. Judas será vivido por Alírio Netto,
que viverá agora uma curiosa experiência: em 2001, ele participou de uma
versão mexicana do musical, mas no papel de Jesus. E Maria Madalena vai
marcar a estreia no gênero da cantora Negra Li. Completam o elenco
principal Fred Silveira (como Pilatos) e Wellington Nogueira (Herodes).
“Vejo a figura de Jesus como um revolucionário”, comenta Rickli. “Ele se
via mais como homem que como deus, o que o torna mais próximo de todos
nós. E, por ser carismático, ainda hoje convence multidões com sua
mensagem de amor.”
Ao contrário de outros musicais dos quais participou, Jesus Cristo
Superstar é, para Rickli, “rock na veia”. “Meu desafio vai ser o de
cantar com muitos agudos e em um ritmo que normalmente não se vê em
espetáculos assim.”
Adaptação também está nos planos de Negra Li que, apesar da voz de
contralto, terá de cantar como mezzo-soprano. Conquistar o papel foi um
grande desafio. “Contratei uma professora para adaptar minha voz ao
canto dos musicais e treinei intensamente durante uma semana. No oitavo
dia, participei das audições”, conta ela, que vai alterar toda a
programação de seus shows. “Não farei praticamente nenhum durante o
primeiro semestre de 2014.”
Para ela, Maria Madalena é uma mulher em todos os sentidos. “Ela sofre
preconceito por ter sido uma prostituta, mas é forte o suficiente para
enfrentar uma paixão por Cristo, mesmo sabendo ser um amor impossível”,
comenta.
Na esteira das transformações, Alírio Netto prepara-se para mudar a
chave. “Judas tem uma performance mais atlética que Jesus”, observa ele,
que já busca um entrosamento com a performance a ser criada por Rickli.
“É muito importante o público acreditar no pensamento de Judas, que
admirava Jesus como homem e não como deus. Daí ser vital a amizade entre
eles ser crível.”
Na telona
Em 1973, Norman Jewison dirigiu uma versão do musical para o cinema, com
Ted Neeley no papel principal. Elogiado, o filme foi rodado em uma zona
desértica de Israel.
Fonte: Estadão